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Ne-Yo, Akon, Mariah… Por que o R&B dos anos 2000 está com tudo no Rock in Rio de 2024?

Último dia do festival terá atrações que comprovam alta do estilo. Entenda retorno do gênero que bombou nos anos 2000, relação com o pagode e com hits at...

Ne-Yo, Akon, Mariah… Por que o R&B dos anos 2000 está com tudo no Rock in Rio de 2024?
Ne-Yo, Akon, Mariah… Por que o R&B dos anos 2000 está com tudo no Rock in Rio de 2024? (Foto: Reprodução)

Último dia do festival terá atrações que comprovam alta do estilo. Entenda retorno do gênero que bombou nos anos 2000, relação com o pagode e com hits atuais. Por que o R&B dos anos 2000 está com tudo em 2024? Quem olha mais desatento o line-up do último dia de Rock in Rio pode se sentir perdido no tempo. Entre as atrações principais do domingo (22), estão nomes que lideravam as paradas de 20 anos atrás: Ne-Yo, Akon e Mariah Carey. Movido pela força nostálgica que dominou a cultura, a estética e os hábitos de consumo da geração Z, o R&B dos anos 2000 está com tudo -- não só no palco do Rock in Rio, mas também de volta às paradas em forma de influência. “A música pop é como uma roda gigante. Você sempre acaba ouvindo sonoridades antigas em músicas atuais”, analisa o produtor musical Rafael Castilhol. Vencedor de um Grammy Latino de Melhor Álbum de Samba/Pagode em 2022, pelo projeto “Numanice #2”, de Ludmilla, ele é hoje um dos nomes mais procurados por artistas interessados em resgatar o R&B. Na terceira edição do “Numanice”, ajudou Ludmilla a criar sua própria versão de “So Sick”, clássico do estilo, gravado pelo cantor americano Ne-Yo em 2006. Na faixa "Era Tão Bom", Castilhol encaixou cavaquinho, banjo, surdo, pandeiro e percussão para transformar o R&B em pagode. É um procedimento comum nos trabalhos do produtor em parceria com a cantora: “Faço muito isso com a Ludmilla. A gente compõe as músicas em R&B e depois transformamos em pagode.” Foi assim com o hit “Maldivas”, por exemplo. “Não moldei essa música em pagode, enfiei o pagode dentro dela.” Pagode, o R&B brasileiro Não é à toa que o pagode é considerado por muitos o R&B brasileiro. "A riqueza harmônica é um elemento em comum entre as composições desses dois estilos. São acordes e progressões mais rebuscadas", explica Castilhol. Show da cantora Ludmilla no Numanice em Curitiba Instagram/Numanice "No sertanejo, por exemplo, é muito comum a presença do que a gente chama de acorde perfeito maior, que são progressões de três acordes. Já no pagode, assim como no R&B, tem mais espaço para mudanças de tom, harmonias que não são sempre a mesma coisa." A aproximação dos dois gêneros gerou a mudança mais significativa do pagode na última década, na opinião de Péricles, que há mais de 30 anos é um dos nomes mais importantes do ritmo. "Está na maneira de cantar. O samba sempre esteve na base, mas passamos a usar blue notes [notas características do jazz e do blues, também comuns no R&B], que não usávamos antes", explicou em entrevista ao g1 Ouviu, podcast de música do g1. "Artistas como Ludmilla, Lucas e Orelha, Ferrugem, Gloria Groove e Dilsinho apareceram com essa linguagem totalmente diferente." Um elemento típico dessa forma de cantar é o melisma -- quando o cantor altera a nota de uma sílaba enquanto ela é cantada. "No R&B americano, os cantores mudam a melodia original: geralmente cantam a primeira parte da música, apresentando-a como ela é. Na repetição, sempre tem uma voltinha a mais, uma mudança na melodia, com certo virtuosismo do cantor", explica Castilhol. "A Whitney Houston fazia isso muito bem. Essa é a forma de cantar do R&B, que acabou influenciando Péricles, Alexandre Pires, Ferrugem, Ludmilla, Gloria Groove e outros nomes do pagode", acrescenta o produtor, que também trabalhou com Gloria no projeto de pagode e R&B "Serenata da GG". Em entrevista ao g1 Ouviu, a cantora celebrou: "O 'Serenata da GG' foi possível porque fiquei atenta aos sinais. Sinto que consegui fazer esse projeto no momento certo." De Prince a Justin Bieber Nos Estados Unidos do pós-guerra, entre as décadas de 1940 e 50, o surgimento do R&B marcou um período em que começaram a se dissolver as barreiras entre o que era conhecido como "música branca" e "música negra". O nome do ritmo foi criado em 1948, para substituir o que antes era chamado de “race music” -- um termo em tom pejorativo para falar de canções feitas por artistas afro-americanos. Prince no Rock in Rio de 1991 Divulgação via BBC Influenciado pelo jazz, soul, blues e a música gospel americana, o gênero se popularizou na voz de Aretha Franklin, Lionel Richie, Prince e outros artistas. Ao longo do tempo, incorporou também elementos do hip-hop, do funk e sons eletrônicos dos sintetizadores. Ficou marcado pelas melodias intensas, os arranjos exuberantes, os vocais rebuscados e o apelo romântico e sensual. Mesclado ao pop, ajudou a impulsionar Alicia Keys, Bruno Mars, Beyoncé, The Weeknd, Rihanna, Justin Timberlake e muitos outros. Na música brasileira, o R&B é presença marcante no repertório de nomes como Tim Maia, Cassiano, Hyldon, Djavan, Jorge Ben e Sandra de Sá. Nos anos 2000, enquanto dominava paradas mundiais, o estilo também brilhava por aqui com Sampa Crew, Fat Family e Adryana & A Rapaziada. Apesar disso, a sigla para rhythm and blues não pegou tanto no país, avalia a cantora compositora Carol Biazin: "Nunca demos o nome para o R&B no Brasil, esse termo não ficou 'hypado' por aqui. Mas a gente consegue associar com os ouvidos: quem gosta de um groove gosta de R&B." Nome frequente nos créditos de hits do pop, Carol ajudou a moldar a influência de R&B em músicas como "Complicado" (de Vitão e Anitta) e "2000" (Luísa Sonza). Ela vê o bom momento do gênero no Brasil como resultado de um fenômeno que aconteceu, primeiro, fora do país. "Justin Bieber surfou no R&B, Ariana Grande também e a SZA ficou muito popular com um álbum bem nessa pegada [o 'SOS', de 2022, vencedor do Grammy de Melhor Álbum de R&B Progressivo]." Destiny's Child em show em Londres, no começo dos anos 2000 Reuters via WAW/AA/SV A compositora cita diferenças entre o R&B contemporâneo e aquele que era produzido nos anos 2000: "Se você pega para ouvir um álbum do Destiny's Child [grupo que revelou Beyoncé], fica chocado com a riqueza e as camadas da produção sonora. Hoje temos uma estética mais minimalista, com timbres mais graves e a voz mais presente." Mas as semelhanças são suficientes para fazer a geração anterior também se beneficiar do movimento. Não por acaso, o cantor Ne-Yo é uma das atrações mais aguardadas do Rock in Rio: seu show recheado de hits de rádio FM espalhou nostalgia no público do The Town, em setembro de 2023, e foi eleito pelo g1 um dos melhores do festival em São Paulo.